A cerimônia de Abertura Nacional do Plantio da Soja para a Safra 2023/24, que ocorreu na manhã de sexta-feira (29) na Fazenda Aymoré, em Jaciara, no sul de Mato Grosso, foi um marco importante para a agricultura brasileira. O evento reuniu aproximadamente 400 pessoas e marcou o início de uma safra que promete alcançar um potencial produtivo impressionante, com estimativas apontando para a possibilidade de colher até 163 milhões de toneladas de soja.
Além do espetacular desfile de plantadeiras que inaugurou a temporada, o encontro contou com a participação de renomados especialistas da cadeia produtiva da soja, que debateram dois temas cruciais em dois painéis distintos: "Desafios da Armazenagem" e "Perspectivas de Mercado".
Um momento de destaque durante a cerimônia de abertura foi o anúncio do presidente do Canal Rural, Julio Cargnino. Ele revelou que a Abertura Nacional da Colheita da Soja já tem data e local marcados: será no dia 1º de março, em Tapera, Rio Grande do Sul. A escolha dessa data é simbólica, uma vez que em 2024, o Brasil celebra 100 anos desde a chegada da soja ao país.
Fernando Cadore, presidente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso (Aprosoja-MT), destacou a notável transformação da agricultura brasileira ao longo das décadas, evoluindo de importador de alimentos para se tornar um dos maiores celeiros do mundo. Entretanto, ele também apontou um desafio crônico que o setor enfrenta: a escassez de armazéns.
Apesar da impressionante produção de 155 milhões de toneladas de soja na última safra, totalizando 315 milhões de toneladas de grãos em 2022/23, o Brasil ainda sofre com um déficit de armazenagem superior a 60% em nível nacional. Cadore ressaltou que a disponibilidade de crédito no Brasil não é favorável à construção de armazéns, criando um grande entrave para a expansão do setor. Ele comparou essa situação ao desafio de operar uma sorveteria com um freezer que só comporta metade dos sorvetes que produz.
Para enfrentar essa questão, Cadore enfatiza a necessidade de uma mudança na mentalidade dos produtores, priorizando a construção de armazéns em suas propriedades. Ele argumenta que, atualmente, é mais fácil para um agricultor substituir uma peça defeituosa em sua colheitadeira do que obter financiamento para construir um armazém.
Anelise Marques, diretora-executiva da Casp e participante do painel sobre os desafios da armazenagem no Brasil, acrescentou que o acesso ao crédito é complicado devido à burocracia e aos altos custos envolvidos. Nos Estados Unidos, a taxa de juros para infraestrutura de armazenagem é de 3,6%, enquanto no Brasil, os produtores enfrentam taxas consideravelmente mais elevadas.
Anelise também apontou a discrepância no número de armazéns nas fazendas entre os dois países. Apenas 15% dos armazéns estão localizados em fazendas brasileiras, enquanto nos Estados Unidos, esse número chega a 66%. Ter armazéns nas propriedades oferece aos produtores uma maior flexibilidade econômica. Ela argumenta que, embora os Planos Safra anunciem recursos recordes, esse dinheiro não chega aos agricultores que realmente precisam. Isso resulta em perdas significativas, pois o Brasil perde cerca de 36 milhões de toneladas de soja devido à falta de armazéns.
Quanto ao mercado de soja no Brasil, o país representa 40% da produção mundial. Durante o painel "Perspectivas de Mercado", Giovani Ferreira, diretor de Conteúdo do Canal Rural, destacou que o Brasil está agregando valor à commodity, com um acumulado anual de 2,5 milhões de toneladas de óleo e mais de 20 milhões de toneladas de farelo.
Vlamir Brandalizze, analista de Mercado, observou que a safra de soja dos Estados Unidos está enfrentando desafios devido à produção 15% abaixo do potencial, causada pelo El Niño que afetou o cinturão agrícola do país. Ele também alertou que os produtores brasileiros precisam melhorar a comercialização, pois têm menos de 20% da safra futura negociada, enquanto o normal seria entre 35% e 40%. Isso pode levar a desafios na negociação da soja nos próximos meses, destacando a necessidade de mais armazéns e capacidade portuária no Brasil.
Apesar dos desafios, o apetite chinês pela soja brasileira continua crescendo, o que é um ponto positivo para os produtores. Com uma produção global estimada em cerca de 400 milhões de toneladas de soja, a demanda permanece forte. No entanto, o mercado de commodities pode enfrentar pressão de preços devido ao excesso de oferta e à influência de fatores como os preços em Chicago. Ainda assim, a China continua sendo um parceiro crucial para as exportações de soja do Brasil, com previsões de exportações de aproximadamente 98 milhões de toneladas em 2023. O aumento da demanda por carne suína na China também é um fator positivo para o mercado de soja brasileiro, uma vez que a soja é um componente essencial na alimentação dos suínos.
Em resumo, a Abertura Nacional do Plantio da Soja para a Safra 2023/24 destacou o potencial produtivo do Brasil, mas também apontou desafios significativos, como a falta de armazenagem adequada e dificuldades no acesso ao crédito. No entanto, o mercado de soja no Brasil continua forte, com a China desempenhando um papel fundamental em suas exportações. Para garantir um crescimento sustentável, é crucial abordar esses desafios e investir na infraestrutura necessária para apoiar a indústria agrícola do país.